16 de janeiro de 2018

Cedo na vida, antes mesmo de saber,
Recebi da minha mãe uma herança.
Antes mesmo de ela morrer,
Já o peso de ser,
Uma eterna criança,
Assustada, enraivecida...

E depois entrei na idade de decidir,
Mas já não tinha escolha,
Era vitima dos meus instintos,
Vivia presa numa espiral,
Em busca daquilo que me daria
Um significado...

Estava desafinada, era estrangeira,
Incapaz de me soltar,
Da sensação de ser,
Um peso a mais na carteira
Da minha mãe.

Procurei outros colos,
Mas eram todos celestiais,
De ouro, e eu estava suja demais,
Para os merecer,
Pequena demais,
Para neles caber.

Triste cruzamento agitado,
Em que todos passam mas ninguém pára,
Onde seguem apressados,
Para chegar a algum lado.

E eu ofuscada pelas luzes,
Para onde quero ir?
Que lugar é este onde ninguém pára,
Para sentir, para ser.

Que mentira é esta que nos faz crer,
Que para viver temos de correr?

Olha para eles...
Será que se vêem?
Sou o que fui e o que quero ser,
Ou serei aquilo que entendo do que foi,
E o que agora quero do depois?


Fica sempre um final feliz por vir,
Uma quimera que o meu coração espera,
Impacientemente ver surgir.

Porque é que todos me deixam partir,
Será a minha casa assim tão assombrada?
Quem terá nela morrido?

Terei sido eu,
Terei eu há muito esquecido,
De arranjar para mim uma saída...

Ainda mal dobrei a casa dos vinte,
E já tão fortemente anseio saber,
Para onde quero ir...
Sou uma incapaz,
Por não me saber capaz.

Sigo pela rua a armadilhar o meu ego,
A fechar conclusões negativas.

A minha flor é decerto a mais bem regada,
Mas caralho de flor que vai morrer.
E todas aquelas horas terão sido em pról de quê?
Que falta é esta?

Eterna procura por aquilo que sou,
Pelo calor que o dia em que acordar me der,
E me faz esquecer do que quero ser,
Daquilo em que me quero tornar.

Não estás aqui para me salvar,
E eu não estou se não a regar,
Uma flor que não tardará a murchar.

Herdei por engano uma falta,
E vivo debruçada sobre uma quimer(d)a,
De que sou mais alta,
De que vivo apenas à tua espera,
À espera daquilo que me falta,
Daquilo que acho que me fará mais alta.
Em tardes de inverno,
Havia uma lareira em casa,
Que insistia em acender,
Mal o sol se punha.

Já que não havia outras luzes,
Que fosse o fogo,
A fonte de calor para
Um coração tão gélido.

Em tardes de inverno,
Havia gatos pela casa,
Que insistia em levar,
Para o meu colo de noite.

Já que não havia outra vida,
Que fosse a vida deles,
A que se ligasse à minha,
A um coração tão só.
MARÇO 2017

Acordei lamentando o meu triste fado,
Três meses cuidando de um ser maltratado,
Mal amado,
Mal...

Para no fim nos braços de outra cair,
Aquela que só teve de chegar,
E eu que fiz meus dias para a fazer sorrir,
Não haverá mesmo espaço para me amar?

Do pranto nasceu a vontade,
De para dentro o amor virar,
De praticar em mim o dom de cuidar.

Consigo ver através das frechas,
A luz a querer entrar,
Chega de a esconder de mim,
Não sou só a que cuida,
A que ama,
A que faz mover.

Não mais o medo de não ser nada,
É tempo de tomar as rédeas da minha vida,
Chega de ser vitima do meu fado,
Triste coração maltratado,
Mal amado,
Mal...

12 de janeiro de 2018

Se hoje escrevo estas linhas, em nenhum momento o faço para atribuir culpa a alguém, culpa é a mim que tenho atribuído, há anos sem fim. Culpa por existir, por ser um peso a mais na carteira daqueles que me sustentam, como tantas vezes já o referi. Olho para trás, e quem sou eu? O que é que se lê através desta existência? O que é que foi motor? Por onde é que caminhei?
Se folhearmos a minha vida, ou os arquivos deste mesmo blog, deparamo-nos com alguns leit motifs, coisas que vão percorrendo a mesma... Uma culpa transbordante, uma dor martirizaste, que pede auxilio, uma esperança infinda em seres passageiros, que quase como a publicidade, me vendem um sonho, um bilhete para um sitio de amor, um lugar onde também existo. Existi e cresci sozinha numa casa grande e confortável, ciente de todos os problemas do mundo, da pobreza, da fome, dos desastres, e sempre fora dotada de uma enorme empatia. Armei-me do casaco mais duro que me dava uma postura firme e decidida, como aquela que via vestida pela minha mãe, e por todas as outras mulheres mais velhas que me cercavam. Uma família de mulheres fortes, destemidas. Eu, como elas, também era forte, uma guerreira nata, para o que viesse, para as mais violentas cruzadas em busca daquilo que queria: Amor e uma Casa. Assim iniciei viagens mundo fora atrás daquele sonho, e fui aprimorando a minha forma de amar, de forma a ser conveniente também para quem procurava. Queria, numa primeira fase, um lugar onde chorar, onde chorar toda a dor de estar a viver uma existência sozinha. Depois, percebi que não estava se não a ajoelhar-me, e que, dessa forma, não me conseguiam ver, ou quando me avistavam, não queriam de mim - afinal quem é que olha para baixo com admiração? Pelo caminho tive a fortuna de encontrar alguém que me viu, que me levou a descobrir muitas coisas dentro de mim, e que ainda hoje me acompanha em prol de me convencer que existem lugares para mim, e que ela é um deles, incondicionalmente. Entretanto, com ela aprendi a sair da minha dor, a não dar tanta importância ao que sentia, a prestar sobretudo atenção ao outro, ao que ele tinha para dizer. Afinal, há que ser coerente, eu gostava do outro, não do que me fazia sentir! Então aprendi a ouvir, a absorver, a procurar, com ele, desvendar a sua existência. Quem melhor do que aquele que anda perdido e que procura olhos para o acompanharem? Quem melhor do que aquele que quer, através da pequenez do outro, assumir a sua grandeza? Elas gostavam de estar num pedestal, eu precisava que estivessem para encher a minha existência, então assim iniciei a minha jornada a servir aquelas que eram tão grandes aos meus olhos, mas tão medianas no seu reflexo... Elas tinham a impressão de comandar, mas elas precisavam mais dos meus olhos do que eu da existência delas. Afinal, se se fossem embora, aparecia logo outra a desfilar em todo o seu esplendor, o que não falta é beleza - nos Outros.
Nada saciava. Procurava criar laços familiares à minha volta, mas nem eles me salvavam naquelas horas mais negras. Afinal, cá estava eu, sozinha naquelas noites em que o manto caia e o mundo deixava de existir. Onde me sentia um peão num cruzamento agitado de uma grande metrópole, em que via muitos carros passar, a grandes velocidades, todos certos de onde vinham e de para onde iam. Eu, o que sabia, eu um grão de areia, um ponto perdido a pairar entre todos. Eu não tinha nada, eu procurava desesperadamente calor, mas ninguém estava aqui para ficar...

4 de janeiro de 2018

Ao mesmo tempo que nós, existe um tempo só meu onde nós existimos também. Em que aquele beijinho que despejo de forma tão fugitiva no teu pescoço, se decompõe e se deixa derreter lentamente pelas tuas costas. E que te deixas arrepiar e soltas os ombros, revelando lentamente os omoplatas....
Ao mesmo tempo que nós, existe um tempo só meu onde nós existimos também. Em que aqueles primeiros contornos que já definimos foram apenas as primeiras peças que completariam o puzzle daquela paisagem tão harmoniosa a que o nosso encontro se propõe a alcançar, os recantos mais brilhantes que nos habitam enquanto seres individuais...
Ao mesmo tempo que nós, existe um tempo só meu onde nós existimos também. Em que aquele olhar com que por vezes te olho, esconde o melhor dos contos que poderia embalar aqueles dois pirralhos que estou já a ver de pijama à espera que lhes falemos destes primeiros momentos em que nos desgostámos um pouco menos, que começámos a juntar as nossas existências que acabariam por culminar neles, naquelas caras luminosas, naquelas vidas lentamente a chegar... 

Ai (suspiro), venham elas a desfilar, que o Sonho é sempre o mesmo, até contigo...

Estive toda a vida procurando um lugar de amor. Descobri algumas casas onde entravam alguns raios de sol por entre os estores e aqueciam tão docemente o meu corpo. Até vir a noite e ter de partir sem o sol a doirar o meu caminho. Não pertencia a lado nenhum, estava sempre de partida, e achava que Ser para mim, era Não Ser para ninguém. Era estar sozinha sem ninguém a testemunhar o que era a minha existência. Alguém tinha de andar ao meu lado, alguém tinha de ouvir os meus lamentos, eu tinha de existir nalgum sitio. A melhor forma de existir para os outros, é aquecendo-os sem nada pedir em troca. Envolvê-los bem forte e não lhes cobrar pelo mesmo abraço. Fazê-los crer que de nós precisam.
Assim sempre foi, e que me importa se não me agarravam da mesma forma? Que importa se quiseram quem lhes fazia mal, se o que era para elas era real? Era todos os dias calor, todos os dias amor. E para mim, uma razão para viver...