8 de setembro de 2020

      Há muitos amores atrás que tento praticar a abnegação total do meu ego em prol da aceitação completa do outro. Todavia, longe estive sempre eu de me esquecer de mim, de não pedir em troca algumas coisas também. Havia, contudo, uma certa fixação por provar o valor do meu sentimento. Afinal, se tanto contemplava o objecto, se tanto o cantava, se por ele eu me ajoelhava e descobria o maior do encantos, dele eu tinha de aceitar a sua realidade sem reclamar. Realidade essa que embatia contra os meus sonhos. Expectativas que tornavam o objecto cada vez menos ele, e cada vez mais eu. 

    Afinal, que fiz eu se não apartar o objecto da sua verdade, levá-lo para um espaço de luz que eu fiz surgir. Sim, o Sonho era todo meu, a luz era toda minha. E na paz desta recordação eu descubro que poderei ter transformado alguns objectos, que poderei ter embelezado uns quantos - para sempre. 

Assim esperava eu, distribuir um amor tão infinito, tão puro, tão belo. 

    Mas depois ela foi-se embora e nunca mais me falou. Nunca voltou atrás para me agradecer, para me abraçar, para me dizer que lhe terei salvo a vida. Ninguém voltou atrás. 

    Tinha voltado ao algarve e estava sol. Era fim de novembro e a minha mãe lá pousada no lugar onde a deixara. Fomos à praia passear de casaco de inverno e até fizemos bolachas de manteiga. Naquela altura eu estava esperançosa. Grande parte das tormentas já tinham passado - ou pelo menos era nisso que eu acreditava. Tinha começado o curso e à beira da piscina celebrava o amor que chegara, o mundo que se acendera, a mágoa que passara...
    E depois veio tudo o resto. 

Sucessão de acontecimentos que só a tua presença reconfortou.

    Nunca ninguém vai saber o que é que tu és, faltará sempre algo a conquistar. 
Seremos sempre submarinos que se cruzam na longa noite. Podemos acenar, ver brevemente o outro no seu interior, mas o caminho rapidamente terá de ser retomado, e o desencontro dará espaço para a tristeza, intima certeza de que estamos sozinhos. 

Eles têm mãe.
Eles têm mãe dentro deles, 
Eu tenho uma criança que continua a chorar.

2 de setembro de 2020

     Recordo um daqueles primeiros dias de Setembro, estávamos a almoçar junto à avenida Fontes Pereira de Melo. Manhã de ressaca, domingo, tempo suspenso, silêncio estranho característico desse final de semana de fim de verão. Nesse instante, o que me separou do medo, foste tu. Eu que vinha de um sitio tão frio, que andava tão sozinha pela minha existência, tu que vieste para a aquecer. Eu que fui encontrar amor onde havia mais, tu que o foste dar, construir matéria cerebral onde não havia. A atrofia dos meus lobos a ser nutrida, nos espaços ocos foram aparecendo recantos bonitos que a tua ternura patrocinou.   

                 Nunca mais serei a mesma. Obrigada.