26 de maio de 2019

Hoje apaixonei-me, não pelo amor mas pela ideia dele. Hoje, ao apaixonar-me pela ideia do amor, eu afastei-me da vida tal como ela é, neguei-a com toda a força e algo em mim desesperou. Presa na discrepância entre aquilo que é e aquilo que devia ser, rejeitei aquilo que não é. E o que é que eu desejava que fosse? Antes de mais, alguma coisa. E quando digo isto percebo que estou sempre à espera daquilo que ainda não é. Porque será que este lugar é tão confortável? Que raio terá acontecido da ultima vez em que foi? Quão dolorosa terá sido a ultima experiência para jamais ter entrado nos sítios onde havia lugar para mim?
Nem ela sabe o quanto é que terá despertado sentimentos tão antigos em mim, que uma vez acordados não pararam de palpitar durante anos, até tanto desesperar e ver-me caída à porta daquela que realmente me salvou. Tanto me salvou que quis ir atrás dela salvar outras pessoas. Foi tudo necessário, e ainda bem! Mas hoje ao acordar apaixonei-me pela ideia do amor e ao olhar para aquilo que existe, não há fotografias suficientes para ilustrar nada, toda a abstracção daquilo que há, existe dentro de nós até ao esquecimento. Não não não, podes relativizar e dizer que, de qualquer maneira, até haver outra coisa, é o que há, mas não estarás tu já tão entranhada pelo investimento que fizeste? Quão assustada estarás tu de sair sem nada nas mãos, e que ainda por cima, sem que ninguém venha atrás... Também ganhaste Leonor, as coisas vieram não da maneira que querias, mas da maneira como foi... Não faças isso, não alimentes a criança assustada e esquecida que vive em ti, ela já estava melhor. Pega-lhe ao colo, diz lhe que está tudo bem, que estás aqui. És tão eximia a fazer isso com os outros, porque é que ainda não consegues fazer isso contigo?

17 de maio de 2019

Pedes-me os meus olhos
Para poderes olhar para ti.
Assim chegas semanalmente;
Consulta de fim de tarde.

Sentes-te observada por mim,
Mas és tu quem te vê,
Eu não sou se não estrada até lá,
Ao volante és tu, vida à dentro.

Aos outros espelhos, que será
Que tu contarás? Eu não sou como
Eles. De mim ecoam bonitas palavras,
Mas no espelho és tu, e terás outras.

Reminiscências que procuram emergir,
Pedaços dolorosos do que foi -
A ser representados, vividos outra vez,
Sob a proteção dos meus braços,

"Eu não te vou deixar, está tudo bem",
Grito eu, agarrando o peso daquilo que vês.
Não te queria conduzir até a um sítio
Escuro e deixar-te lá. Não vás.

E tu vais, por hoje já foi suficiente.
Se amanhã acordares, longe de mim
Encontrarás paz. Longe de mim,
A possibilidade de não mais olhar.

Então longe de mim mas ainda
Dentro de ti, emergem imagens.
A dormir dói menos, a dormir
Tudo é possível, até o impossível.

A dormir também estou eu,
À espera de poder voltar a existir
Eu que para mim escolho contar
Com tão pouco de ti. E todavia,

A dormir dói menos, a dormir
 tudo é possível, até o impossível...



4 de maio de 2019

Não sei de que tempestade virão, elas que escolho acolher - abraçar com tanto carinho. De rompante me reconhecem e me encontram e querem aportar!  - e como não! 
Falo no plural e parece que tão pouco me importa o que são na sua individualidade - e todavia! É nos seus detalhes que encontro o gosto da descoberta, sempre único e individual, sempre belo e transcendental - pelo simples facto de o ser!
Se vêm de amores tumultuosos eu lhes provo a constância do mesmo. Tão mal tratadas pelo dever ser! quando nem sequer bom era! A verdade é essa. Tivemos de arranjar desculpas para a tempestade, como se "tivesse de ser!' como se tivesse ela de ser parte constituinte, só porque sempre foi! 

-"Isso é a Paixão!", ouço.

Mas amor - meu amor - tanto aos meus olhos transcende o mistério, esses espaços escuros  dos outros que recheamos com os nossos próprios desejos - os nossos, meu amor - que tanto nos afastavam da realidade daquilo que realmente é. - sou eu e és tu - encontro magnífico neste imenso escuro. No lugar do mistério não está mais o Ideal, mas começa-se a desvendar o que realmente é Real.

Não é mais nada. Somos nós neste momento em que nos encontramos. E olha como somos belas longe uma da outra. Porque seríamos outra coisa aos olhos nossos? - não meu amor, eu não quero ser como eles.

O que tu és eu quero contemplar. Não vieste para ser para mim e de ti não careço para me ver bem. Parece-me certo de mais deixar-te ser tudo aquilo em que te quiseres tornar.