15 de dezembro de 2013

Quando aqueles dias, aquelas datas que sabíamos de cor, aquela sequência tão tangível, aquela história tantas vezes narrada, aquele sentimento tão fortemente sentido, se transformam em neblina.
Para onde fui?
Dou por mim perdida entre datas e acontecimentos que esqueci, dou por mim a cheirar um perfume que já não suscita nada em mim. Amei, recordei, e um dia tudo parece exterior ao que sou hoje.
A saudade já não mora em mim, porque haveria de ter saudades de algo que não sinto que vivi? De uma história que me foi contada, de algo estrangeiro a mim... Sempre vivi projectada no futuro, correndo atrás de uma utopia, e sempre ansiei para que os dias passassem, e me levassem até lá, até à utopia.
E hoje, ela está aqui, tenho-a nas mãos.

Mas,

tic tac
tic tac 

O ponteiro avança prontamente rumo ao fim....

Tornei-me naquela que sempre desprezei,
Limpa, lúcida,
Constante.

Tenho sede do infinito.




3 de dezembro de 2013

Catástrofe

Quando todo o universo nos cai em cima. Quando a crise, ou a guerra, são apenas faits divers, quando a dor de cabeça que sentimos devia ser, a nosso ver, a notícia que corre em todos os telejornais. Por nos parecer, nesse preciso instante, que nada de mais terrível acontecera algum dia neste mundo. Somos nós, nós e uma dor de cabeça tão forte, daquelas que não deixam espaço para qualquer sensação. Não está calor, não está frio, não temos sono, não temos fome, toda a vontade se concentra num só ser.
Curioso é que acreditamos, com toda a nossa força, que nunca no passado sentimos algo de tão intenso. Mas a dor já cá morou, com tanta ou mais intensidade um dia se mostrou. Mas hoje, hoje parece o primeiro dia.

Ninguém, mais ninguém, nunca mais mais ninguém.
Só há uma pessoa, sempre será aquela pessoa, a única.

Sempre a mesma história, sempre o amor mais forte que sentimos, sempre aquele que mais nos desfez em pranto.

Mas este momento chega sempre, esta dor suprema, este cansaço esfomeado de dias melhores. E a dor de cabeça continua, e as horas não passam, e as imagens vêm às dezenas, e já a nostalgia a bater à porta de mão dada com o arrependimento. E lá vêm as dúvidas e a culpa. E brincamos, como brincam os adultos, com ironia, um pouco com a dor de cabeça, moldando-a como plasticina, dando-lhe uma forma bastante bizarra, algo de bastante decadente. E esquecemos-nos da forma original, e temos nas mãos um objecto completamente fantasiado, que não corresponde à sua essência.

E outros dez minutos, e a respiração volta ao normal, a dor de cabeça faz agora força nos olhos, mas as imagens são demasiado violentas, e não param de chegar às centenas. E de repente abrimos bem os olhos, olhamos para o vazio e uma luz surge, e o nosso corpo levita ligeiramente, e inundados em calma, porque as imagens desapareceram, chegamos a uma conclusão, a uma em que nem sequer acreditamos; eu mereço mais.

Que bela ilusão arranja a razão ao coração, sustendo os seus impulsos por instantes, pondo fim a uma guerra de cem anos, encontrando finalmente a paz e a motivação para fechar os olhos e simplesmente adormecer. Que gesto tão banal, adormecer? E o que é feito da minha dor de cabeça? Aquela que devia ser notícia em todo o mundo... Adormecer durante uma catástrofe? Porque não? Quando a catástrofe é uma fatalidade, que mais fazer se não esperar que acabe?