30 de agosto de 2013

Utopia

Quando nos dão algo sem pedir nada em troca, desconfiamos sempre. Vivo contigo uma espécie de utopia e ao principio, estive sempre um pouco reticente em relação a ti. Falava de ti com paixão, mas sempre com a certeza de que seria momentâneo, que rapidamente acabaria, por saber que a utopia é, por definição, irreal. Fui vivendo diariamente a nossa história, sem qualquer projecção no futuro. O limite sempre fora os dois meses, e mal dobrei essa esquina, esperei pelo fim como uma fatalidade. Porém, foi então que tudo ganhou dimensão, que tu te despiste diante de mim mostrando a tua verdadeira essência. E o sorriso cego que tinha na cara foi, pouco a pouco, decrescendo. Já não eras uma utopia, mas uma realidade. A felicidade, foste tu que a trouxeste, e fizeste-me acreditar nela, e acima de tudo, desejá-la. Contudo, sou, por essência, uma spleenada, que nestes últimos meses eliminou essa faceta, mas como eliminar algo que é parte maioritária de um todo? Voltei a ter momentos de tristeza, e temia que isso te afastasse. Mas tu ficaste, tu aceitaste. Sempre te avisei que mais tarde ou mais cedo a tristeza voltaria, e com ela a bipolaridade, porém, a tristeza chegou, mas com a tua ajuda, não me afogo mais nela, porque a felicidade que trazes, vence-a sempre.
Gostava de ti por aquilo que me trazias, hoje gosto de ti por aquilo que és, porque és uma pessoa fantástica, a única que quero, porque és real, porque já não te quero para falar sobre ti, mas para me tornares numa pessoa melhor, como me tens tornado todos os dias, porque dias contigo não são um futuro idealizado, mas um presente vivido, e muito rápido um passado recordado. És real, e pela primeira vez as coisas não se passam só na minha cabeça.
E não será esta a verdadeira utopia? Um dia acabará, um dia a utopia será um inferno. Mas enquanto durar, tentarei tudo para retribuir o bem que me deste. Porque me salvaste e porque te devo séculos de felicidade.

16 de agosto de 2013

Cativa

Ficarei eternamente cativa nos braços que me abraçarem, nas mãos que me tocarem, sejam elas rugosas, secas, sedosas, porque me faltaram braços e mãos em noites frias e escuras, e sua ausência pesou tanto no meu ser, que abriu um grande vazio na minha alma, que procura se preencher, e que julga encontrar consistência no afecto daqueles braços e daquelas mãos. Coisas estrangeiras e inconsistentes que utilizam o toque para a sedução, e que através deste sentido despertam algo em mim, e se revelam reais, mas tão frágeis pois delas não ecoa nenhum nome. São braços e mãos soltos de um corpo, membros dispersos, sem alma, que me seduzem e me corrompem. Escrava daquelas mãos e daqueles braços, eu cedo por me sentir só. Mas tão rápido me desiludo de toda aquela monotonia, do mesmo caminho tantas vezes repetido, da mesma sensação, efémera, fugaz e melancólica. E a ruptura não se prolonga, chega num dia de manhã, quando a lucidez bate à porta e convida-a a entrar. E a memória daquelas noites faz com que a porta de minha casa fique sempre aberta, aberta a todos os que estiverem lá por mim, e para mim. A casa cheira a egoísmo, raiva e suor, e são poucos aqueles que vieram para ficar, pois o corpo não funciona sem alma, e aquelas mãos e aqueles braços estão isentos de alma, sabor que não alimenta, agua que não tira a sede, eterna ilusão que torna o real ainda mais desejado!

Ficarei eternamente cativa na esperança de um dia sentir com o coração, aqueles braços e aquelas mãos...

4 de agosto de 2013

Ser transcendente

Bastava naquela tarde eu não ter sabido que o que procurava estava no bairro alto para não ter ido lá, bastava que essa coisa estivesse la para não me ter encontrado sozinha diante de tanta gente, bastava não ter escolhido aquela rua para não o ter encontrado, bastava que tivesse escolhido outro bar para não as ter conhecido, bastava que os outros estivessem mais animados para eu não voltar, bastava a outra não ter vindo ao meu encontro para eu partir, bastava ela não ter mostrado interesse para eu não te conhecer. Bastava ter escolhido a outra para nunca te voltar a ver, bastava ter encontrado alguém para não a querer, bastava que a que já a tivera não estivesse lá para eu a poder ter, bastava que não tivesses bebido tanto, que as outras tivessem ficado, que uma das outras tivesse tentado, que eu não te tivesse ingenuamente engatado, que eu não estivesse carente, que fosse responsável e tivesse ficado em casa, que não me tivesses dito mais nada, que eu não fosse irresponsável ao ponto de ir sair na véspera de um exame, que o sono tivesse falado mais alto, que o telefone ficasse sem bateria, que ele não tivesse aparecido, que que que....

Tantos acasos que me levaram a este momento, que eu sou tentada a ser um tanto fatalista, ingenuamente penso que só podia estar destinado a acontecer, pois bastava uma mínima coisa para que nada disto fosse real. Tem de existir um elemento adjuvante que força as coisa; o azar, a sorte, não podem ser totalmente aleatórios, há decerto alguém a lançar os dados, há quem lhe chame Deus, Natureza ou outras designações, eu não sei o que é, não sei se é um ser inteligente, ou se é simplesmente uma força, mas a verdade é que o mundo está demasiadamente bem organizado para que o acaso o tivesse criado, e esse Ser tem, sem duvida, de ser um Ser transcendente, ao qual nunca ninguém poderá aceder. Alguém que existe sem existir, e que tem respostas para tudo. Mas seremos então realmente livres? Se ele decide aquilo que é decisivo, o destino daquela jogada de risco, a sorte ou o azar...fará de nós seres livres? Estará a nossa existência nas nossas mãos? Será que a graxa que os homens dão a Deus é suficiente para que a sorte esteja com eles? O que fará com que esse Ser nos dê o privilégio da sorte? Merecê-la através do Bem que espalhamos? Ganhá-la pelas mudanças positivas que trazemos ao mundo? Se é o Bem que nos traz a Sua confiança, então como é que ele deixa que os homens se batam por Ele? Armas de fogo lançadas em Seu nome, homens que procuram espalhar o Seu nome, e o fazem através da força; homens que fazem o Mal julgando fazer o Bem? Como é que Ele o permite?

Nunca ninguém saberá responder com certezas a estas perguntas, mas hoje, encontrei respostas ao comportamento humano, a uma fé reconfortante, a um fanatismo assustador. Percebi a fragilidade dos homens que são consequentemente manobrados por um Ser transcendente, e percebi o porquê das igrejas. Percebi sem nunca me identificar. Não me fio em especulações, e tenho dificuldade em perceber porque é que as desgraças continuam a acontecer a tão boa gente...

Não sei se é Deus, ou outra coisa, mas obrigada por me teres trazido aquilo que tanto pedia.