28 de abril de 2012

Sem ele

Realmente não vale a pena, há algo que me traz sempre de volta a ele. Não é ele, é apenas a sede que tenho por inspiração. Ele não é nada, ele não merece nada. Dou lhe demasiadas palavras e esqueço-me daquilo que ele me fez passar. Esqueço-me da dor mais pura que ele me deu a conhecer, esqueço-me das horas que passei afogada em lágrimas, arfando e desejando uma saída. Esqueci-me de que nada é real, de que isto é apenas uma ilusão, uma coisa que criei na minha cabeça para me manter ocupada.
Eu era mais esperta, hoje dou tudo em troca de nada. Vou empobrecendo de dia para dia, vou me tornando vulnerável e submissa. Eu sou mais do que isso! Eu sou mais alta, mais importante. É por mim que ele devia chorar.
Hoje sou eu quem interessa! Já passei demasiado tempo a contemplar os outros, é tempo de me valorizar! É tempo de andar para a frente e é tempo das pessoas olharem para mim, não por o que faço, mas pelo que sou. E eu sou mais, eu não sou esta coisinha débil e assustada, eu não sou um livro aberto. Tenho tantas mais cartas para jogar, porque é que insisto em jogar sempre as mesmas? Há mais para além disto, há um mundo recheado de segredos e de enigmas por desvendar. Estou a perder tempo, estou a ser teimosa e orgulhosa. Não é ele que me vai parar, dois anos passaram sem que eu andasse para a frente, dois anos passaram e eu despi-me diante de todos, eu dei a conhecer a minha maior fraqueza e afoguei-me na minha própria confusão. Fui tão feliz, e no entanto pintei-me de negro...Passei os melhores momentos mas procurei sempre algo que me entristecesse, encontrei-o nele, encontrei naquilo que mais poderia ser espremido. E espremi até à ultima gota, adquiri com isso um imenso sumo que bebi para poder vomitá-lo em forma de palavras.
Foi tudo falso, ele não é real, ele existe nesta roupa porque eu vesti-o assim, eu criei este monstro que me mutilou. Eu criei algo tão perfeito afim de me destruir e de cultivar a minha mágoa.
Mas hoje é o dia em que tudo acaba, é o dia em que vou fechar o meu livro, e codificar todas as minhas palavras. Porque eu a partir de hoje nunca mais me vou expor, nunca mais me vou dar a quem me quer fazer mal. Hoje sou eu, e amanhã serei de novo eu, sem ele.

Dilema

Ainda não decidi se quero continuar a padecer por ele ou se quero viver na ilusão de não padecer até ao dia em que o sofrimento vier todo de uma só vez e destruir toda a esperança que criara até lá. Ou talvez não seja uma ilusão, talvez desta vez seja apenas verdade. Mas como hei de saber se me enredo por caminhos complicados? Será que estou pronta para reviver tudo ou será que tenho de largar? Para quê largar algo de tão enriquecedor? Doí, eu sei que doí, mas faz-me sentir viva, faz-me acreditar que tenho um objectivo e uma meta, faz-me sonhar e da-me aquilo que mais quero, palavras para o contar.
Encaro a situação com a maior naturalidade pois há muito que a novidade acabou. Hoje falo apenas de algo que se tornou um hábito e de uma coisa bastante banal. Eu nunca gostei de coisas banais, mas sempre gostei de vícios, pois os vícios por muito banais que sejam, são indispensáveis e sempre que os consumimos, sentimos que eles deixam de ser banais saboreando-os como no primeiro dia.
Já não me cansa, já não me entristece, já não me mata. Estou mais forte e mais calma, estou pronta para fazer qualquer coisa, estou pronta para largar e estou também pronta para ser paciente. Tenho tudo para ter sucesso, só não sei que sucesso é que quero. Depois de tanto tempo, será que a taça vale o esforço?

25 de abril de 2012

Não quero fugir,
Mas tenho de correr,
Não quero esquecer,
Mas tenho de conseguir,
Não quero seguir em frente,
Mas tenho de andar.
Não quero outra pessoa,
Mas tenho de a ter,
Não quero estar longe de ti,
Mas tenho de estar sozinha.
Não quero que me ames,
Mas quero te amar.

10 de abril de 2012

Escuro

As luzes do meu quarto apagaram-se, o que contagiou o resto da casa. Estou às escuras e já fiz tudo para arranjar luz, mas sempre que tento consertar o quadro eléctrico, vejo uma faisca bem luminosa oriunda de uma pequena falha num dos fios. Fico diante dela, temendo que ela se converta num indomável fogo. Paro de mexer e espero. Recomeço mais uma vez mas não encontro a solução. Não há mais nada a fazer, vou cortar o pequeno filamento que resta, bem sei que é ele que ainda liga a corrente eléctrica mas já tentei tudo para remediar este problema. Pego no alicate, aproximo-o do fio, mas há qualquer coisa que me retém. Volto a tentar mas apercebo-me de que é melhor esperar. Corro para o meu quarto e escondo-me debaixo dos cobertores e fico esperando que o problema se resolva. Umas horas mais tarde, volto a ir ver o quadro e já não vejo nenhuma faisca. Acendo as luzes e a paz paira no ar, consigo até vê-la a flutuar como um gás cromático à luz da lua. Só um milagre curou o meu mal.
Esqueço toda esta história e volto a entregar-me à minha rotina. Até que um dia, as luzes do meu quarto apagam-se, o que contagia o resto da casa. Corro em direcção ao quadro e lá está a maldita faisca! Pego num alicate, abro a corrente, reconstituo os fios mas em vão. O problema não está nos fios, o problema está na própria alimentação. Pouso o alicate calmamente e o suor cobre-me agora a integralidade da fronte. Sento-me e permaneço apática. O meu pensamento perdeu-se entre tanta confusão e desesperança, não consigo encontrá-lo pois as imagens que passam na minha mente são muito breves mas muito violentas, na medida em que representam a minha infância passada nesta casa às escuras. A primeira lágrima forma-se, e escorre sem parar ao longo da minha face, como uma lamina que passa ao longo da ferida mais antiga do meu corpo.

9 de abril de 2012

Uniformidade

É engraçado de ver como mudei ao longo deste anos. Deixei para trás todo o peso de uma infância difícil e acreditei em algo inimaginável. Guardo muitas memórias dos tempos em que era frágil, tempos em que desejava soltar-me. Tinha tanto para dar, só não sabia como. No entanto guardo ainda mais memórias de quando mudava, de quando tudo me parecia arriscado e todos os olhares se direccionavam para mim. Tudo o que fazia era pensado pois tinha sempre a sensação de que estava a ser observada. Era pequena para lidar com olhares alheios e com injúrias, era grande demais para não ser vista. 
Na rua, todos se riam, nunca percebi se se riam de mim ou para mim, pois sempre aceitei que fosse de mim. Pouco a pouco procurei soltar-me deste peso e fui ignorando o mundo que me rodeava, centrando-me no meu ser. Foi difícil de adquirir algum egoísmo, foi difícil de encontrar a chave. 
Fugia das crianças como quem foge de uma doença, tinha medo da sinceridade e de toda a inocência que as fazia debitar as mais diversas opiniões, e nunca quis ouvir o que as pessoas tinham a dizer a meu respeito. Ainda hoje fujo às opiniões, porque hoje, tudo o que faço tende a ser pensado, e raramente aceito que o meu pensamento esteja errado.
Hoje adoro crianças, soltei-me do medo que me separava delas, hoje sou apenas fácil de atingir por aquilo que não se vê. As crianças já não se questionam sobre o meu sexo e já não gozam com o meu cabelo, as crianças gostam do meu sorriso e não encontram defeitos tão rapidamente. 
Sou uma pessoa mais forte na integralidade, alcancei aquilo que queria. Nunca quis ser perfeita, sempre quis ser apenas regular. Dessa forma poderia ser confundida no meio da multidão, poderia viver livremente sem estar presa na mente de desconhecidos. Ninguém olha para aquilo que é à primeira vista igual, todos avaliam o que é diferente. E eu não nego a minha diferença, simplesmente estou saturada de cruzar-me com tantos olhares. Odeio movimentos de grupo, e sempre critiquei o que é uniforme, mas se "toda a gente" gosta de uma coisa, não será porque essa coisa é boa? De qualquer maneira, não sou alguém que se deixa influenciar pela norma, mas o que acabo de relatar é exclusivamente em termos físicos. Porque a exuberância e a excentricidade é só para os mais solitários, eu fico-me pelo banal afim de evitar a saturação e o contágio. 

3 de abril de 2012

Procurei tantas vezes a mágoa
e quando a encontrei
fiquei sem nada para dizer