11 de agosto de 2017

Nas noites que precedem dias menos bons, é comum abrir-se dentro do meu peito um abismo e ouvir das suas entranhas, uma criança já consciente, a pedir ajuda. Há noites em que o seu medo a faz bater incessantemente contra as paredes do mesmo, e tudo o que ecoa é um pulsar mais rápido do coração, noutras, porém, consigo ouvir o seu grito e inclusive o mesmo me escapa pela boca e comove os seres vivos que à minha volta se aninham. Todavia, esta agonia procura um Ser para a patrocinar, causa exterior a ela própria que a justifique. 
A criança que em mim habita sou eu. A outra que vive seus dias como Ser em controlo da sua vida e do rumo dela, também sou eu. Ambas convivem de forma contraditória, e ambas procuram encontrar-se num lugar de amor. Não é antiga a relação que ambas estabelecem, porque só recentemente é que se reconheceram como habitantes da mesma psique. Há desde então uma tentativa de se salvarem mutuamente. Há uma que tem o dever de o fazer, e naturalmente que não será aquela que vive escondida e assustada nos recantos mais sombrios do meu corpo. Todavia, essa última, certas vezes, se entranha no sangue e chega até aos braços levando-os a procurar quem os envolva, sem que a outra tenha controlo. Quando carecem braços, começa a ruína daquela que procura caminhar impetuosamente até um sitio melhor, pois a mesma se esquece de qual esse sitio, e são-lhes relembradas todas as chagas que nela figuram. É a criança que toma controlo e que se procura lamentar.
Tenho aberto as portas que me ligam a ela, tenho acendido as luzes para que ela saiba que há luz fora dali e que basta seguir seu rasto e subir até cá a cima, mas houve em tempos outras luzes que afinal não iam dar a lado nenhum, ou se apagavam antes de iluminarem. 
Haverão certamente estratégias para a resgatar, e todos os dias enquanto for viva, a tantarei salvar, e por fim estar em controlo do que sou e de onde quero chegar. 
A verdade é que ela me ensinou tudo o que sei, mas é tempo de a encontrar e dar-lhe todo o calor de que carece, para por fim caminharmos abraçadas para onde queremos ambas chegar.

1 de agosto de 2017

Àqueles que julgam que entrego meu coração a um Leão,
Que tanto insisto em decorar com véus e flores,
Que saibam que o Leão e a Virgem convivem no seu coração,
Coração de Carneiro que em nada me lembra outros amores.

Apaixonei-me primeiro pela Virgem que nela vi reflectida,
Mas a juba que se ergueu não me deu se não mais vontade de a Sonhar,
De encontrar todas as peças, até as mais escondidas,
Para traçar seus contornos e o seu puzzle completar.

Cada vez que surgem as suas garras afiadas,
Só tenho de me lembrar: Virgem de Mármore e Ouro,
Não sofre não de suas unhas e dentadas;
Há então que preservar quem magoa como um Tesouro.

Medo de sangrar, medo de me entregar...
Se cultivar meu prado e tão bem o regar,
Não há que esperar pelo Sol que o outro tem para dar,
Há que aceitar o que dói para não mais magoar.