21 de maio de 2023

 Queria saber pintar para te mostrar o que imagino. Sei que as imagens não têm vida, que estão paradas, e que mostram um momento, mas nunca o que vem depois, muito menos o que aconteceu antes. Quando te imagino a chegar a casa, estás sempre cansada e eu sempre feliz de te ver. Quando nos zangamos, é sempre de fácil resolução. 

Os filhos que temos, olha como eles já cresceram, já vão à escola todos os dias e és tu quem os leva. Sempre foi assim, mas no início ficavas chateada porque era contigo que choravam, porque se iam separar de ti. À tarde, quando os ia buscar, estavam felizes e era a mim que viam - sei que é injusto. 

Não sei encaixar o álcool, se calhar não tem mesmo lugar nesta história. 

Que giro, é aquela mesma mesa onde eu jantava, há muitos anos atrás, quando ainda éramos uma família. Não sei como é que ainda tão bem me lembro de estarmos os 4 sentados. Agora não sei bem quantos somos. 

Encaixo uma família dentro de outra, misturo dois tempos no mesmo espaço. A transgeracionalidade a operar, mas com um elemento reparador, ou assim espero. Estarei eu a procurar o mesmo marido ausente que a minha mãe? Tu, em mim vais encontrar o pai depressivo, que bebe, que trai? Eu irei trair como a minha mãe? 

Não, isto é um quadro parado, não é bem um retrato, é mais o exacto momento em que chegas a casa, e o jantar está pronto, e estamos todos felizes por te ver.