28 de julho de 2021

Olho para elas, imagino como seria estar perto delas, elas ali no topo daquele prédio, afastadas de mim. Planeio as minhas jogadas - com cuidado - para elas não perceberem - porque elas percebem tudo, elas estão num plano superior da existência, elas as que escolhi por entre a multidão de anónimos. Elas são agora as mais inteligentes, capazes de perceber tudo, de ler através de mim, conhecer as minhas intenções mais profundas. Se as conheci no plano horizontal, rapidamente elas se elevaram para o vertical. No vertical, a dialética é outra. Ela ensinam-me, elas ditam as regras, elas não se confundem comigo. Nesse plano vertical, a minha submissão é grande, estou refém das suas vontades. Se me castigam, eu tenho de aceitar, foi sempre assim. 

Aprimoro os meus passos, torno-os menos evidentes, escondo-lhes as minhas exigências e vontades - tenho medo de ser intensa de mais, de as incomodar. Quando dou por mim estou novamente naquele sitio tão familiar. Eu, sem qualquer poder, à mercê do que quiserem fazer de mim. Elas sabiam, elas sabem tudo, e por mim terão agora decidido.

 Estou sempre tão certa do quão especiais e elevadas elas são, que isso acaba por me inibir de observar também os meus passos. Que contributos farei eu para sempre me encontrar no mesmo lugar? O que é que ele representa? A evidência de que se trata de uma reminiscência da minha infância não basta. Por detrás disso, há qualquer coisa que pode ser feita e que eu não estou a querer ver. 

Escondo-lhes as minhas exigências e vontades, e será que elas as conhecem mesmo? O que acontecerá quando elas souberem, quando consistentemente eu as afirmar...? 

Estranho lugar este em que finalmente começo a saber o que quero, a afirmar isso sem medo das represálias. Estranho lugar este em que as coisas correm melhor, em que elas passam a ser um bocado mais iguais a mim, falíveis, reais. Passo tanto tempo a pensar na existência delas, decifrar as suas intenções, elas que são tão diferentes de mim, muitas vezes tão menos exigentes e perfecionistas, será que elas compreendem mesmo aquilo que entre nós acontece? Não serei eu aquela que nos leva para essas repetidas indefinições, quem será aquela que finalmente tudo controla e que tudo sabe

Não serei eu?

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