4 de novembro de 2012

Janela sobre as minhas férias

Amanhã vou finalmente poder tirar férias daquelas horas mortas a consumir preguiça e vícios acessórios, vivendo sem futuro, sem chão. Vou voltar a andar para a frente, vou me poder levantar com a certeza de que voltarei a cair no mesmo buraco, e pelas mesmas razões. Mas a rotina traz a abstracção, reduz o tempo livre, tempo esse que nos guia por caminhos obscuros, que nos reduz a simples criaturas da rua, sujas, pobres e de um azedume muito característico daqueles que invejam a condição alheia. Estou me a ver, à chuva, corpo rente à calçada desta rua, a agua a escorrer pelo chão formando um pequeno riacho, a minha roupa coberta de lama, não, não estou sozinha, há outros, não os conheço mas eles lutam pelos mesmos vestígios de comida. Tenho medo, medo da noite, medo da solidão, medo da morte, sou uma ratazana suja e desprezada por aqueles que dominam o mundo, por aqueles que acham dominá-lo! E contento-me com o amor que sinto por aquela pessoa que passa diante de mim todos os dias debaixo do seu chapéu de chuva e que sorri, aquele ser humano mais humano do que eu, sorri. Sorri para mim... para mim!
Vou tirar férias desse sorriso que se tem escondido atrás do chapéu de chuva e que procuro em vão, com um desejo físico de o encontrar, com um impulso que me leva a querer correr ao seu encontro, um desejo destrutivo, um desejo que não se fica por desejo e corroí todos os outros pensamentos, todas as outras vaidades, que me mantém de cabeça virada para aquilo, e só aquilo... Preciso de me voltar a encontrar, preciso de estabilidade para perceber se quero essa instabilidade, se é real o que sinto, se vale a pena. Vou-me lavar, vou-me vestir, voltar para casa, voltar ao liceu, mas como posso voltar ao liceu depois do que eu vivi? Depois do mundo que eu vi? Depois de tanta miséria, de tanta agonia. Não consigo ignorar as ultimas semanas, não consigo perceber a minha família, a maneira como vive e como despreza ratazanas como eu. Cresci tanto nestas ultimas semanas, quem me dera não ter visto o que eu vi, seria tudo tão mais fácil...

1 comentário:

Anónimo disse...

Gostei muito. Crias sempre metáforas muito interessantes.