13 de outubro de 2012

Infância

Família, casa cheia, crianças aos berros, jantar à mesa, fins de semana em família, dias de sol, crepes, bolos ou biscoitos de manteiga, férias num resort com pais e amigos, programas às vezes chatos como ir ao horto ou ao museu, mas no fim só havia uma coisa: a felicidade.
Fui buscar estas imagens ao poço das minhas recordações, um poço bem profundo onde as encontrei disfarçadas por algas e gastas pelo tempo. Foi há tanto tempo, é tão difícil pensar nesse período da minha vida como sendo real, é tão utópico, tão fascinante... Quando é que a minha vida se apartou de tudo isto? Quando é que a solidão chegou? Não consigo fixar um momento, não me lembro de quando é que comecei a ser independente. Sei que foi muito cedo mas não sei como é que obtive tanta independência de uma só vez. Não censuro ninguém, sei que me deu força, no entanto quando olho para esses dias da-me uma súbita vontade de chorar, de chorar mas ao mesmo tempo de sorrir porque aconteceu e porque foi tão bonito! Mas foi curto. Mudar de casa foi sem duvida aquilo que despertou em mim esta nostalgia, foi a primeira vez que vivi noutro sitio, e é a primeira vez que valorizo o sitio anterior, não porque gostava de voltar mas porque é a minha casa, foi lá que eu cresci e não importa quantas modificações se fizeram ao longo dos anos, aquela casa nunca deixou de ser a minha casa. É lá que eu me sentia segura, quando estávamos lá todos, quando ela não estava abandonada a estranhos, quando éramos muitos e felizes. Quando não usávamos só dois quartos, a cozinha e a sala. Quando íamos para o sótão, quando comíamos na sala de jantar, quando ligávamos a lareira e os aquecimentos, quando era a nossa casa e quando essa casa estava cheia. Não há coisa pior do que ter uma casa grande só para duas pessoas, pois no momento em que uma delas se encontra sozinha lá dentro, há um súbito sentimento de vazio que cresce. E tudo nos assusta, e tudo nos faz falta.
Tive uma infância muito recheada, mas que desapareceu sem que eu desse por isso. Estou a alguns meses de acabar o liceu, mais uma casa que terei de deixar, mais uma coisa boa que ficará para trás. E assusta-me porque eu não conheço mais nada, e acima de tudo porque eu não estou pronta para conhecer, estou feliz onde estou... Estou a alguns meses de ser adulta, de ser responsável, de me entregar por completo à solidão. Não será a vida adulta uma fonte de melancolia? Não quero crescer, mãe, não quero deixar de estar ao colo ou de fazer o embrulhinho, quero voltar a ir para praia dentro de um cesto... Não é mais ele quem eu quero...aliás, tomara que eu nunca mais amasse...



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