10 de abril de 2012

Escuro

As luzes do meu quarto apagaram-se, o que contagiou o resto da casa. Estou às escuras e já fiz tudo para arranjar luz, mas sempre que tento consertar o quadro eléctrico, vejo uma faisca bem luminosa oriunda de uma pequena falha num dos fios. Fico diante dela, temendo que ela se converta num indomável fogo. Paro de mexer e espero. Recomeço mais uma vez mas não encontro a solução. Não há mais nada a fazer, vou cortar o pequeno filamento que resta, bem sei que é ele que ainda liga a corrente eléctrica mas já tentei tudo para remediar este problema. Pego no alicate, aproximo-o do fio, mas há qualquer coisa que me retém. Volto a tentar mas apercebo-me de que é melhor esperar. Corro para o meu quarto e escondo-me debaixo dos cobertores e fico esperando que o problema se resolva. Umas horas mais tarde, volto a ir ver o quadro e já não vejo nenhuma faisca. Acendo as luzes e a paz paira no ar, consigo até vê-la a flutuar como um gás cromático à luz da lua. Só um milagre curou o meu mal.
Esqueço toda esta história e volto a entregar-me à minha rotina. Até que um dia, as luzes do meu quarto apagam-se, o que contagia o resto da casa. Corro em direcção ao quadro e lá está a maldita faisca! Pego num alicate, abro a corrente, reconstituo os fios mas em vão. O problema não está nos fios, o problema está na própria alimentação. Pouso o alicate calmamente e o suor cobre-me agora a integralidade da fronte. Sento-me e permaneço apática. O meu pensamento perdeu-se entre tanta confusão e desesperança, não consigo encontrá-lo pois as imagens que passam na minha mente são muito breves mas muito violentas, na medida em que representam a minha infância passada nesta casa às escuras. A primeira lágrima forma-se, e escorre sem parar ao longo da minha face, como uma lamina que passa ao longo da ferida mais antiga do meu corpo.

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