Sempre pensei que a mágoa me fosse trazer inspiração, e que o trauma só
alimentaria as minhas palavras, e sempre procurei um trauma sem saber que me
perseguiria diariamente e me assombraria com tanta intensidade. Acabou por vir,
o trauma hoje existe em mim, vive comigo há uns dias e lamento tê-lo chamado.
Ele agarra-se à minha mente com os seus tentáculos e destrói qualquer tentativa
de abstracção. Só penso nele, vejo e revejo aquela imagem na minha mente vezes
sem conta, aquele sussurrar, as expressões e eu imóvel e
apática pensando que não estaria a acontecer. As imagens são poucas, as
sensações fugiram, guardo apenas um momento que se confunde com um pesadelo.
Tive muitos destes sonhos e quando aconteceu não soube distinguir da realidade.
Foi fugaz demais para que houvesse espaço para reflexões, foi fugaz demais para
que houvesse medo e no meio de tanta fugacidade só houve tempo para um reflexo
tardio, para algo que impedisse o que se sucedia.
Ainda hoje me questiono acerca desse momento, ainda hoje pergunto a mim
mesma se aconteceu, se é real, se devo estar como estou. Esmiucei a minha
memória, procurei organizar tudo cronologicamente, procurei o momento em que
perdi a noção das coisas, o momento em que tudo se transformou num pesadelo, um
pesadelo real.
Escrevo estas linhas porque vivi, escrevo-as pensando que preferia não
tê-las escrito, pensando que preferia não ter sentido, que preferia não saber e
que preferia não ter escolhido este modo de vida. E de repente questiono-me
acerca da minha escolha, acerca do meu futuro, acerca do que me espera, e
acerca do que procurei. Penso que foi um erro, que nenhum título justifica o
que eu sinto, que nenhum reconhecimento pode sequer apagar a dor que carrego,
que nenhum sonho se alimenta de tal pesadelo.
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